sexta-feira, 24 de abril de 2009

Papapapapapaa...

Precoce, com uma musicalidade nata, grande carisma é atualmente considerada a "musa do folk nacional". Em seu aniversário de 15 anos pediu aos avós que lhe dessem seu presente em dinheiro, com o qual gravou músicas de sua autoria e as colocou no My Sapce, a partir daí começou uma carreira meteórica e ascendente. Convidada a participar de vários programas de TV, chamou a atenção de Marcelo Camelo (ex-Los Hermanos) com o qual gravou uma música para o primeiro álbum solo dele. Em 2008 saiu em turnê com o My Space Music Tour com entrada gratuita, no mês de outubro desse mesmo ano grava seu primeiro DVD num show lotado em SP e em novembro chegou seu primeiro CD, o qual saiu primeiro em aparelhos celulares numa promoção da operadora VIVO, que mantém um site sobre ela . Faz show amanhã em SP no Citibank Hall, as 22 horas.



J1

Well I take a notebook I walk away
This paper which I took makes me say
Papapapapaa


Will I have to try again
Say Papapapapaaa
For you to understand?

I should have known you better,
I should have hugged you more
Before I write you that letter
I should have done what
I've been looking for
Papapapapapaa

Will I have to try again
Papapapaa for you to understand?

Am I that weird?
Am I that strange?
I've got one fear
It is so hard to change
So papapapapaaa

Will I have to try again
Papapapapapaapa
For you to understand

Am I that weird
Am I that strange
I've got one fear, which is so hard to change

Papapapa
Will I have to try again
Papapapaaapapaa
For you to understand
Paraparapapa Pararapapapapararara

I should have known you better,
I should have hugged you more
Before I write you that letter
I should have done what
I've been looking for

Papapapapaa
Will I have to try again
Papapapaaapapaa
For you to understand

But I am weird
And I feel strange
I've got one fear, it is so hard to change

segunda-feira, 20 de abril de 2009

O Chá



"Thich Nhat Hanh, um monge budista vietnamita, ensina como se deve apreciar uma boa xícara de chá. Para isso, você precisa concentrar-se no momento presente, ficar consciente e com a atenção voltada para o chá. Sentir o calor da xícara, apreciar o colorido da infusão, aspirar seu perfume, degustar lentamente cada gole. Se você fica remoendo eventos passados, ou preocupando-se com os futuros, de repente vai se dar conta de que bebeu todo o chá sem nem perceber."

Aceitas uma xícara?

sábado, 18 de abril de 2009

Tudo Novo de Novo

Completamente por acaso soube hoje (sexta) da estréia desse novo programa da TV Globo. Fui conferir e confesso: me surpreendeu! Gostei muito do texto e das interpretações, sobretudo de Júlia Lemmertz, embora Marco Ricca, Guilherme Fontes e Arieta Corrêa também estejam muito bem em seus papéis. A história, de Lícia Manzo e supervisionada por Maria Adelaide Amaral, é sobre a atual família brasileira composta por pais separados, filhos de casamentos diferentes e das tentativas de vida a dois. Achei muito honesto, verdadeiro e me simpatizei com as personagens da trama.


quinta-feira, 16 de abril de 2009

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Girassóis



(...) beleza perfeita, um girassol! uma tranqüila e girassol existência
excelente e perfeita! um olho doce natural para a melancolia da lua nova, desperto vivo excitado
sacando no crepúsculo sombra a brisa mensual de ouro aurora! (...)

Allen Ginsberg

quinta-feira, 9 de abril de 2009

+ sobre a série "Tudo o que é sólido pode derreter"

De acordo com matéria exibida no Metrópolis, a série vem com abordagens diferenciadas para cada obra literária apresentada em cada um dos 13 capítulos e, sobretudo, buscará o contato e a sensibilização do adolescente para a literatura. Estréia nessa sexta, dia 10/04, às 19h30. A conferir! ;D

terça-feira, 7 de abril de 2009

Eu sei, mas não devia.


A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.

(1972)


Marina Colasanti nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.


O texto acima foi extraído do livro "Eu sei, mas não devia", Editora Rocco - Rio de Janeiro, 1996, pág. 09.

fonte: www.releituras.com
----------------------------------------------------------------------------------

Chega um momento que não dá mais para se resignar e aceitar, simplesmente aceitar a rotina, a estar na vida e não vivê-la de maneira mais plena, apenas para seguir o roteiro que nos foi previamente determinado. Há que se recuperar esses horizontes perdidos, quanto mais cedo melhor, o tempo não espera ninguém...
;D

PS.: Obrigado, Alfredo, por me apresentar um dia essa crônica singular de Marina Colasanti, a você dedico esse post! - [ ]'s

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Adoráveis Mulheres (Little Women, 1994), sensibilidade e emoção

Baseado no romance da americana Louisa May Alcott "Little Women" (fora de catálogo no Brasil, encontrado apenas em sebos, editado pela Companhia Editora Nacional, sob o título "Mulherzinhas" com tradução de Godofredo Rangel), o filme do diretor Gillian Armstrong e estrelado pela ainda jovem Winona Ryder e Susan Sarandon, é de uma delicadeza ímpar. Um enlevo para quem gosta de ver um bom roteiro e atuações singulares. Jo March é das minhas heroínas prediletas do cinema, por caminhos inexplicáveis do ser, me identifico muito com sua paixão e intensidade, seu amor a literatura e a sua família. Recentemente revi a esse belo filme, cuja a emoção, e o frescor é sempre o mesmo, é como visitar pessoas e lugares muito familiares. Clássico!


sábado, 4 de abril de 2009

Livro "Por um fio" de Drauzio Varella vira peça de teatro

Com direção de Moacir Chaves o livro "Por um Fio" do médico e escritor Drauzio Varella (224 pgs. Companhia das Letras 39,50 reais) ganha uma releitura teatral. Contudo não é dramatugia que o que se pretende com o espetáculo mas uma transposição fiel da linguagem de Drauzio, em ritmo de leitura, as personagens retratadas, doentes terminais de câncer que ao saber do diagnóstico adotam uma nova postura diante da vida, vão contando suas histórias através dos atores Regina Braga e Rodolfo Vaz. Sem dúvida alguma merece ser visto!



A seguir, o primeiro capítulo do livro:


1º Capítulo -

Morte é a ausência definitiva. Tomei consciência desse fato aos quatro anos de idade, dois meses depois de ter ficado órfão. Estava sentado à mesa do café-da-manhã, encolhido por causa do frio; minha avó espanhola, de vestido preto, vigiava o leite no fogão, de costas para mim.

Naquela noite, tinha sonhado que passeava de mãos dadas com minha mãe por uma alameda de ciprestes que havia na entrada da chácara de meus tios, na rua Voluntários da Pátria, em Santana, um bairro de São Paulo.

- Vó, nunca mais vou ver minha mãe?

Sem demonstrar a solicitude habitual com que respondia minhas perguntas, ela permaneceu calada, cabisbaixa na direção da leiteira.

Vinte anos mais tarde, na faculdade, descobri que tratar de doentes graves era o que mais me interessava na medicina. Por essa razão, passei os últimos trinta anos envolvido com pessoas portadoras de câncer ou de aids, em convívio que moldou minha forma de pensar e de entender a existência humana. No começo da carreira imaginei que, se ficasse atento às reações dos que vivem seus momentos finais, compreenderia melhor o “sentido da vida”. No mínimo aprenderia a enfrentar meus últimos dias sem pânico, se porventura me fosse concedido o privilégio de pressenti-los. Com o tempo percebi a ingenuidade de tal expectativa: supor que, por imitação ou aprendizado, seja possível encarar com serenidade a contradição entre a vida e minha morte é pretensão descabida.

Não me refiro à morte de estranhos nem à de entes queridos, evidência que só nos deixa a alternativa da resignação, mas à minha morte, evento único, definitivo.

No exercício da profissão aprendi que a reação individual diante da possibilidade concreta da morte é complexa, contraditória e imprevisível; impossível compartilhá-la em sua plenitude.

Há muitos anos penso que, se conseguisse construir um caleidoscópio com as histórias dos doentes que conheci na prática da cancerologia, com as reações de seus familiares e amigos próximos, talvez pudesse transformá-lo num livro. Se até hoje me faltou coragem para tanto, foi por me considerar imaturo para a natureza da empreitada.

Será possível na juventude compreender o que sente um senhor de oitenta anos ao perceber que não sairá vivo do hospital? O sofrimento de uma mulher ao perder o companheiro de quarenta anos de convivência harmoniosa pode ser imaginado por alguém de trinta?

Se me dispus a escrever agora, aos sessenta anos, foi menos por reconhecer a aproximação da maturidade do que por receio de morrer antes de me julgar preparado para alinhar as lembranças e inquietações que se seguem. Imaginar a morte como um fardo prestes a desabar sobre nosso destino é insuportável. Conviver com a impressão de que ela nos espreita é tão angustiante que organizamos a rotina diária como se fôssemos imortais e, ainda, criamos teorias fantásticas para nos convencer de que a vida é eterna.

“Por que comigo?” foi a indagação que mais ouvi de quem recebe o diagnóstico de uma enfermidade fatal.

Nada transforma tanto o homem quanto a constatação de que seu fim pode estar perto. Existe acontecimento comparável? Um grande amor? O nascimento de um filho?

Certa ocasião, fui ver um senhor acamado. Em frente à casa erguiam-se três coqueiros altos; na garagem, emparelhados, brilhavam dois Mercedes-Benz, um cinza e o outro vermelho, conversível. O quarto iluminado tinha dois níveis: no inferior, três poltronas de couro e um tapete persa; no de cima, a cama de casal, o criado-mudo e uma chaise-longue, na qual ele se achava recostado. Foi a primeira vez que vi um telão com equipamento de som montado na parede. O doente pálido, barba branca por fazer, olhar enérgico, entregava a um rapaz franzino as contas a pagar no banco. Pela calça do pijama descia uma sonda urinária; um frasco de soro irrigava continuamente a bexiga.

Quando terminou a explicação, ele perguntou ao garoto se havia entendido. Irrequieto, o menino respondeu que sim, virou-lhe as costas e saltou os três degraus da escada que separava os níveis do quarto. Com os olhos parados na direção da porta, o doente falou como se ninguém o ouvisse: “Dava o que tenho para dar um pulo desses”.

O diagnóstico de uma doença fatal é um divisor de águas que altera radicalmente o significado do que nos cerca: relações afetivas, desejos, objetos, fantasias, e mesmo a paisagem. “Nunca mais foi como antes”, ouvi de muitos doentes curados e de outros que vieram a falecer.

Certa manhã ensolarada, fui à casa de um professor de agronomia que não cansava de elogiar as virtudes da mangueira frondosa plantada por ele mesmo no quintal mais de quarenta anos antes. Homem de gestos contidos, sobrancelhas unidas, passara a noite com dores fortes causadas por um tumor de esôfago que obstruíra a passagem para o estômago. Nos últimos dois dias regurgitava até a água tomada aos pequenos goles. Só havia conseguido pregar os olhos às cinco da manhã, embriagado pela quinta dose de morfina.

O quarto estava na penumbra. Enrolado em dois cobertores, ele dormia apenas com a cabeça de fora, mas abriu os olhos e tentou sorrir assim que sentei na cadeira ao lado. Depois de examiná-lo, achei melhor levá-lo para o hospital.

- Pela última vez, doutor?

- Honestamente, não sei.

Quando levantei para chamar a ambulância, ele interrompeu com delicadeza:

- Não há necessidade, minha mulher me leva de carro. Fechado na ambulância, não enxergo nada. Tem sol, quero ver as árvores e as moças bonitas na rua.

Tratei de um senhor de mais de oitenta anos, ex-combatente da Guerra Civil Espanhola, portador de um câncer de laringe, que se negou a aceitar a laringectomia, operação em que a laringe inteira seria retirada (com ela, as cordas vocais) e a traquéia exteriorizada para sempre num orifício aberto no pescoço. Dizia preferir a morte a perder a voz e respirar por um buraco escondido atrás de uma toalhinha. De nenhuma valia foi a insistência das filhas e dos dois genros que gostavam dele. Ao tomar a decisão, estava consciente de que, se o tumor crescesse um pouco mais, o ar poderia faltar-lhe nos pulmões, e a vida seria questão de minutos. Espanhol à antiga, não voltou atrás; para ele, não era não.

Diante da recusa fizemos um tratamento com drogas associado à radioterapia, que havia acabado de ser descrito por um grupo da Universidade de Michigan. A resposta foi brilhante. Cinco anos depois, numa consulta de rotina, entrei na sala de exame e o encontrei sem camisa, sentado na maca. Parecia Pablo Picasso velho, naquela foto famosa. Falei da semelhança, e ele riu; contou que tinha nascido numa aldeia vizinha à do pintor.

Naquele momento de descontração fiquei feliz de vê-lo curado, e perguntei se ele não teria aceitado a operação nem mesmo quando a falta de ar apertasse o cerco. Respondeu que não. Insisti:

- O senhor é religioso, acredita em outra vida?

- Não.

- Então, qual o sentido de preferir morrer a perder a voz?

- Doutor, a vida traz pessoas queridas e momentos de felicidade, que um dia serão tomados de volta. Perdi meus pais, minha companheira de cinqüenta e seis anos de casamento, dois irmãos mais velhos na guerra e meu filho do meio num desastre. A gente não encontra explicação para essas tragédias, mas com o tempo se conforma, na esperança de que ainda haverá de entender o verdadeiro significado delas. Precisei ficar velho para compreender que esse dia jamais chegará, porque a vida não tem sentido nenhum; nós é que insistimos diariamente em atribuir um significado a ela. Uma hora, o destino exige um sacrifício tão grande para continuarmos vivendo que a gente se cansa: em nome do quê, vou passar por isso?

Esse senhor morreu de ataque cardíaco anos depois, enquanto dormia. Hoje fico em dúvida se ele recusaria mesmo a operação no momento em que se desesperasse de dor ou falta de ar. O apego à vida é uma força selecionada impiedosamente pela natureza nos milhares de gerações que nos precederam; os desapegados levaram desvantagem reprodutiva.

No Hospital do Câncer de São Paulo fui médico de uma senhora italiana, casada com um pedreiro português aposentado que não saía do lado dela. No dia em que a esposa faleceu, encontrei-o na portaria do hospital para entregar-lhe o atestado de óbito, e o convidei para tomar café, com a intenção de confortá-lo. Quando perguntei como organizaria a vida sozinho, uma vez que não tinham filhos, respondeu:

- Tenho que ir em frente.

- De que jeito?

- Doutor, meu avô dizia que viver é como percorrer um caminho num desfiladeiro de onde partem tiros disparados a esmo. As balas podem acertar qualquer um, mas derrubam com mais freqüência os velhos, as crianças pequenas e os debilitados. Quando um corpo cai, alvejado, os outros são obrigados a se desviar e a continuar em frente, porque a ordem é seguir sempre em frente, mesmo sem saber aonde o caminho nos levará.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Chico Buarque lança seu novo livro "Leite Derramado"

Chegou às livrarias no sábado, 28/03/2009, o novo romance do celebrado cantor, compositor e escritor carioca Chico Buarque, "Leite Derramado" (ed. Cia. das Letras, 200 pgs., R$ 36). Ambientado no Rio de Janeiro e conta a saga de uma família desde o Império até os dias atuais, Chico escreve com o mesmo prazer que compõe suas canções, mesmo que por vezes o resultado seja meio seco, árido. A seguir, o próprio, lendo um trecho do novo livro...



Trecho do livro:

Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na raiz da serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental, não é por causa da morfina. Você vai dispor dos rendados, dos cristais, da baixela, das jóias e do nome da minha família. Vai dar ordens aos criados, vai montar no cavalo da minha antiga mulher. E se na fazenda ainda não houver luz elétrica, providenciarei um gerador para você ver televisão. Vai ter também ar condicionado em todos os aposentos da sede, porque na baixada hoje em dia faz muito calor. Não sei se foi sempre assim, se meus antepassados suavam debaixo de tanta roupa. Minha mulher, sim, suava bastante, mas ela já era de uma nova geração e não tinha a austeridade da minha mãe. Minha mulher gostava de sol, voltava sempre afogueada das tardes no areal de Copacabana. Mas nosso chalé em Copacabana já veio abaixo, e de qualquer forma eu não moraria com você na casa de outro casamento, moraremos na fazenda da raiz da serra. Vamos nos casar na capela que foi consagrada pelo cardeal arcebispo do Rio de Janeiro em mil oitocentos e lá vai fumaça. Na fazenda você tratará de mim e de mais ninguém, de maneira que ficarei completamente bom. E plantaremos árvores, e escreveremos livros, e se Deus quiser ainda criaremos filhos nas terras de meu avô. Mas se você não gostar da raiz da serra por causa das pererecas e dos insetos, ou da lonjura ou de outra coisa, poderíamos morar em Botafogo, no casarão construído por meu pai. Ali há quartos enormes, banheiros de mármore com bidês, vários salões com espelhos venezianos, estátuas, pé-direito monumental e telhas de ardósia importadas da França. Há palmeiras, abacateiros e amendoeiras no jardim, que virou estacionamento depois que a embaixada da Dinamarca mudou para Brasília. Os dinamarqueses me compraram o casarão a preço de banana, por causa das trapalhadas do meu genro. Mas se amanhã eu vender a fazenda, que tem duzentos alqueires de lavoura e pastos, cortados por um ribeirão de água potável, talvez possa reaver o casarão de Botafogo e restaurar os móveis de mogno, mandar afinar o piano Pleyel da minha mãe. Terei bricolagens para me ocupar anos a fio, e caso você deseje prosseguir na profissão, irá para o trabalho a pé, visto que o bairro é farto em hospitais e consultórios. Aliás, bem em cima do nosso próprio terreno levantaram um centro médico de dezoito andares, e com isso acabo de me lembrar que o casarão não existe mais. E mesmo a fazenda na raiz da serra, acho que desapropriaram em 1947 para passar a rodovia. Estou pensando alto para que você me escute. E falo devagar, como quem escreve, para que você me transcreva sem precisar ser taquígrafa, você está aí? Acabou a novela, o jornal, o filme, não sei por que deixam a televisão ligada, fora do ar. Deve ser para que esse chuvisco me encubra a voz, e eu não moleste os outros pacientes com meu palavrório. Mas aqui só há homens adultos, quase todos meio surdos, se houvesse senhoras de idade no recinto eu seria mais discreto. Por exemplo, jamais falaria das putinhas que se acocoravam aos faniquitos, quando meu pai arremessava moedas de cinco francos na sua suíte do Ritz. Meu pai ali muito compenetrado, e as cocotes nuinhas em postura de sapo, empenhadas em pinçar as moedas no tapete, sem se valer dos dedos. A campeã ele mandava descer comigo ao meu quarto, e de volta ao Brasil confirmava à minha mãe que eu vinha me aperfeiçoando no idioma. Lá em casa como em todas as boas casas, na presença de empregados os assuntos de família se tratavam em francês, se bem que, para mamãe, até me pedir o saleiro era assunto de família. E além do mais ela falava por metáforas, porque naquele tempo qualquer enfermeirinha tinha rudimentos de francês. Mas hoje a moça não está para conversas, voltou amuada, vai me aplicar a injeção. O sonífero não tem mais efeito imediato, e já sei que o caminho do sono é como um corredor cheio de pensamentos. Ouço ruídos de gente, de vísceras, um sujeito entubado emite sons rascantes, talvez queira me dizer alguma coisa. O médico plantonista vai entrar apressado, tomar meu pulso, talvez me diga alguma coisa. Um padre chegará para a visita aos enfermos, falará baixinho palavras em latim, mas não deve ser comigo. Sirene na rua, telefone, passos, há sempre uma expectativa que me impede de cair no sono. É a mão que me sustém pelos raros cabelos. Até eu topar na porta de um pensamento oco, que me tragará para as profundezas, onde costumo sonhar em preto-e-branco.

Leia crítica na Folha de S. Paulo

quarta-feira, 1 de abril de 2009

"Tudo o que é sólido pode derreter"

Falando em TV Cultura, o primeiro episódio de uma série inédita voltada para o público jovem vazou há duas semanas na internet. A direção é de Rogério Gomes, um dos produtores de "Tapa na Pantera" que foi um enorme sucesso no YouTube há dois anos. A série mistura o cotidiano de uma adolescente com os livros que ela lê. Serão treze episódios com referências ás obras que irão cair no vestibular entre as quais, "Dom Casmurro", "Senhora" e "Macunaíma". De acordo com O Jornal Cruzeiro On Line "A ideia de aproximar o cotidiano adolescente com o melhor da ficção surgiu em 2005, quando Rafael e o amigo Esmir Filho filmaram o curta "Tudo O Que É Sólido Pode Derreter". Soturno e poético, o filme de 16 minutos vê a vida de Debora (interpretada pela mesma Mayara) pela ótica de "Hamlet", de Shakespeare. "Com o roteiro, vencemos o Cultura Inglesa Festival. Deu tão certo, foi tão bem-aceito, que pensamos em continuar com a história. Aprofundamos a personalidade da personagem e mudamos o nome para Thereza", explica o diretor." Esse primeiro episódio enfoca a obra "Auto da Barca do Inferno" de Gil Vicente. Iniciativa mais do que louvável da Cultura em visitar o universo literário e de alguma forma torná-lo acessível aos jovens e ao grande público. Vamos acompanhar a série, mais notícias e críticas em breve aqui no blog. Em primeira mão e na íntegra o Episódio 1 da série "Tudo o que é sólido pode derreter":